Por Cleiton Gomes
O conceito de plenitude dos gentios apresentado por Paulo em Romanos 11:25, é uma das expressões mais significativas de toda a sua teologia. Trata-se de um tema que não pode ser compreendido isoladamente, pois envolve tanto a história da pregação do evangelho às nações quanto o cumprimento progressivo das profecias hebraicas sobre a restauração de Israel e a integração dos povos ao plano redentivo do ETERNO.
Em sua essência, essa plenitude não representa uma substituição de Israel pelos gentios, mas um processo de inclusão, amadurecimento e reconciliação universal, cujo propósito é restaurar tanto a Casa de Israel quanto as demais nações sob a autoridade do Messias.
LEIA O ESTUDO COMPLETO SOBRE ROMANOS 11:
https://www.defesadatora.org/2022/07/romanos-11-e-teologia-da-substituicao.html
O termo grego usado por Paulo, to plērōma tōn ethnōn, pode ser traduzido literalmente como “a completude das nações” ou “a plenitude dos gentios”. A palavra plērōma significa “plenitude”, “totalidade” ou “realização completa”. Ela não se refere a uma quantidade de pessoas ou a uma contagem numérica, tampouco estabelece limites geográficos ou étnicos, mas descreve um estado de maturidade espiritual. Trata-se de um processo qualitativo e não quantitativo.
O contexto de Romanos 11 revela uma reflexão profunda sobre o relacionamento entre Israel e os gentios. O apóstolo explica que o endurecimento de parte de Israel é temporário e tem uma finalidade pedagógica: permitir que a mensagem da redenção alcance as nações.
Quando esse processo se completar, o endurecimento cessará e “todo Israel será salvo” (Rm 11:26). O ETERNO, portanto, usa a inclusão das nações como meio de provocar um despertar espiritual em Israel, conduzindo o povo de volta à aliança. A plenitude dos gentios é, assim, uma etapa do plano redentivo universal, uma fase dentro da história da restauração, e não o seu fim.
Historicamente, esse processo teve início com a expansão do evangelho para além dos territórios de Israel, conforme registrado em Atos capítulos 10 e 11. Nos primeiros anos, a mensagem do Messias era anunciada apenas a israelitas naturais. Yeshua formou uma comunidade de discípulos judeus e os enviou primeiramente às “ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mateus 10:6). O movimento messiânico era essencialmente judaico e centrado em Jerusalém, tendo como foco o arrependimento (teshuvá) e a restauração da aliança.
Após a ascensão de Yeshua, uma intensa perseguição se levantou contra os discípulos, levando muitos a se dispersarem para outras regiões. Essa dispersão, ainda que motivada pela oposição religiosa e política, foi o meio usado pelo ETERNO para que a mensagem do Reino alcançasse outras nações. A pregação de Pedro à família de Cornélio e o trabalho missionário de Paulo em Antioquia marcam o início da transição da mensagem messiânica de Israel para o mundo gentílico. A partir desses eventos começou o período que Paulo denomina “plenitude dos gentios”.
Contudo, o significado da plenitude vai além da conversão de indivíduos não judeus. Ela se conecta ao tema profético da restauração das duas casas de Israel, especialmente à Casa de Israel (ou: Casa de Efraim), também chamada de Reino do Norte. Segundo o relato de Gênesis 48:17-19, Jacó abençoou Efraim, filho de José, dizendo que dele sairia uma “multidão de nações”. Em hebraico, a expressão usada é “melo hagoyim”, literalmente “plenitude dos gentios”. Essa mesma expressão parece ecoar nas palavras de Paulo em Romanos 11:25, sugerindo uma ligação entre a bênção de Jacó e o tempo profético das nações.
Os descendentes de Efraim foram levados ao exílio pela Assíria (2 Reis 17) e, ao longo dos séculos, perderam sua identidade étnica, sendo assimilados entre os povos. A profecia, porém, garante que o ETERNO não os abandonaria. Parte da missão messiânica consiste em reconduzi-los à aliança, não como um grupo étnico distinto, mas como parte de uma restauração espiritual abrangente.
Limitar, porém, a plenitude dos gentios apenas à Casa de Efraim seria uma compreensão parcial. O termo ethnōn, utilizado por Paulo, refere-se às nações em sentido amplo e inclui tanto israelitas dispersos quanto povos de origem não israelita. Dessa forma, a plenitude abrange todos os que se unem à aliança por meio de Yeshua. Ela contempla, de um lado, o retorno espiritual dos efraimitas e, de outro, a inclusão dos gentios de todas as nações que, mesmo sem vínculo genealógico com Israel, creem no Messias e são enxertados na boa oliveira.
A plenitude dos gentios, portanto, não é um fenômeno restrito a Israel, mas um evento universal e inclusivo. O propósito do ETERNO não é restaurar apenas as tribos dispersas, mas alcançar todos os povos que respondem ao chamado da fé. Essa universalidade está em perfeita harmonia com as palavras dos profetas: “Muitos povos virão e dirão: vinde, subamos ao monte do ETERNO, e de Sião sairá a Torá e de Jerusalém a palavra do ETERNO” (Isaías 2:3).
A mensagem de Paulo tem suas raízes nas Escrituras Hebraicas. Ele não cria um conceito novo, mas amplia profecias já reveladas. A promessa feita a Abraão de que “em ti serão benditas todas as famílias da terra” (Gênesis 12:3) é a base dessa inclusão. Essa promessa é repetida e desenvolvida em textos como Isaías 49:6, onde o ETERNO declara que o Seu servo seria “luz para as nações”, e em Deuteronômio 32:21, onde Ele anuncia que provocaria ciúmes em Israel “por meio de um povo que não é povo”. E os Salmos repetem diversas vezes o chamado das nações para se unirem ao louvor de Israel (Salmos 67 e 117).
Há, contudo, divergências de interpretação entre estudiosos e comunidades de fé. Alguns afirmam que a restauração das duas casas já se cumpriu e que o tempo presente não está mais relacionado a essas profecias. Essa leitura, porém, ignora o caráter progressivo e inacabado da história redentiva. Embora parte do povo tenha retornado à aliança e o evangelho já tenha alcançado grande parte das tribos perdidas, a plenitude ainda não foi atingida. A restauração das casas de Israel é um processo em andamento, e sua consumação se dará apenas com a vinda do Messias, quando Ele reagrupará as doze tribos e reunirá consigo as nações que se uniram à Sua aliança, conforme a promessa de Deuteronômio 30:3-5.
Dessa forma, a plenitude dos gentios deve ser compreendida como um período histórico e espiritual de integração, iniciado no primeiro século com a pregação dos apóstolos e que se estende até o retorno do Messias. Esse período cumpre o propósito duplo do ETERNO: restaurar as tribos perdidas de Israel e incluir as nações em um mesmo corpo de fé. Não é uma questão de números, mas de transformação espiritual e de maturidade das nações diante da verdade revelada. Quando essa plenitude se completar, cessará o endurecimento parcial de Israel, e a promessa profética se cumprirá plenamente: “Todo Israel será salvo” (Romanos 11:26).
Em síntese, a plenitude dos gentios é o estágio da história da redenção em que o ETERNO amplia Sua misericórdia a todas as nações, conduzindo-as à raiz da fé israelita e preparando o cenário para a restauração final de todo o Seu povo. Ela começou com a pregação dos apóstolos, continua a se desenvolver em nossos dias e alcançará sua culminação com o retorno do Messias, quando Ele reunirá as doze tribos de Israel e os gentios que se uniram à Sua aliança, formando uma só família, um só rebanho e um só pastor.
Seja iluminado!!!
0 Comentários
Deixe o seu comentário